terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Intemporal


Música a tocar na vitrola: "Universe and u" Kt tunstall


Ela entrou no quarto nas pontas dos pés, como se fosse uma bailarina quase a flutuar no ar, o seu coração acelerado batia tão alto que poderia acordar a cidade inteira.


E lá estava ele, ela o observou calada durante alguns instantes, podia passar a eternidade toda a olhar para o seu rosto, ele estava tão sereno...

Mas o tempo é o grande inimigo dos amantes, e o tic tac do relógio o afastava cada vez mais de si.


Aproximou-se da cama, seus lábios quase tocavam a orelha dele, num sussurro a sua voz pronunciou o nome amado, e ele despertou do sono, abriu os olhos e mesmo na escuridão do quarto a reconheceu.

Ela sorriu...


-Chiuuuuu! Disse ela fazendo beicinho e com o dedo indicador na boca do amado.


-Vieste te despedir de mim? A voz dele reflectia a dor que o seu coração carregava, aquele momento era sempre doloroso, pois ao mesmo tempo que estava junto dela, sabia que seria por pouco tempo, e nunca tinha a certeza absoluta se um dia a voltaria a ver.


Ela balançou a cabeça a responder que sim.


-Desta vez a culpa foi minha...


Ela o olhou a recriminar por aquelas palavras.


-Sabes que eu não acredito em culpados, e sabes o que eu penso...


Ele a olhava com admiração, ela era sempre tão corajosa.


-Sim eu sei, se não for hoje vai ser amanhã, se não for amanhã vai ser outro dia, e se não for nesta...


-Será em outra vida!!! Completou ela com um grande sorriso.


Ele amava aquele sorriso, nos momentos que a sua alma ficava escura, e a esperança ficava presa por um fio, era a lembrança daquele sorriso que o trazia de volta a luz.


-Adoro saber que tens sempre razão. Sua mão tocava a face quente dela, e ela como um gatinho mimado aninhava-se ao seu lado.


-Nada disso importa, eu tenho certeza que da próxima vez vamos ter mais sorte...


-Como podes ter certeza?


Toda a face dela sorria, e ele soube logo a resposta.


-A música... E ele também sorriu.


-A música... Confirmou ela.


A felicidade de segundos atrás fugiu do rosto dele rapidamente quando lembrou do tempo que ficariam separados, ela sempre lia os seus pensamentos nas linhas do seu rosto.


-Estende a tua mão esquerda...


Ele obedeceu, faria qualquer coisa que ela ordenasse, afinal era ela...


Ela colocou a sua mão esquerda sobre a dele e com os dedos desenhou um circulo na palma da sua mão, depois fechou os seus dedos, como se tivesse guardado ali um tesouro.


-Um presente para me teres ao pé de ti quando eu me for embora.


Uma lágrima caiu dos seus olhos, e ela a secou com os seus dedos.


-Não chores meu bem, sabes bem que uma lágrima tua quebra o meu coração em mil pedaços.


-Queria ter a tua força... A voz dele tremia, todo o seu corpo tremia.


-E eu queria ter a tua determinação.


-Longa se torna a espera...


Os seus olhos despediam-se, pois as suas bocas jamais conseguiam pronunciar o adeus.


A imagem dela desvaneceu no ar como fumaça, os seus olhos abrigavam um mar de lágrimas, e elas rolavam pela a sua face como uma forte chuva de verão.


Lá fora o sol nascia, mais um dia, mais uma vida, sem ela, sem ele...


Ele abriu os olhos, a sua mão esquerda ainda estava fechada, ele a abriu, e de lá saiu um aroma a baunilha,coco e canela, aquele aroma era tão familiar...


O telefone tocou, ele olhou para o outro lado da cama, a sua companheira continuava a dormir, com as mãos tremulas atendeu a ligação.


-Lucas? Perguntava uma voz chorosa do outro lado da linha.


-Sim, quem fala?


-Sou eu a Isabela, Lucas eu sei que você e a Gabi já não se falavam a algum tempo, mas achei que deveria saber que ela faleceu esta noite.


-Como...Como isso aconteceu?


A sua voz tremia...


-Não sabemos, ela simplesmente se foi... Estava a dormir e não acordou mais, o que nos conforta é que achamos que ela não sofreu, pois quando a encontramos ela estava a sorrir, parecia que estava a sonhar...


A história deles passava na sua cabeça como um filme, ele culpava-se, naquele momento percebera que mais uma vez desperdiçara a chance de estar ao lado dela.


A voz dela surgiu na sua memória, a música...


Eles iriam ter outra oportunidade, e ela o reconheceria novamente, ela sempre o reconhecia.


Agarrado ao aroma que ela deixara na palma da sua mão, ele jurou mais uma vez que seria forte, por ela.

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