Foto LiliRozeA mente de uma criança é um circo de portas abertas onde qualquer magia é possível.
Ella adorava quando os pais a deixavam na casa da avó paterna, não por gostar da avó, ela era uma tirana que roubava o tempo de tudo, "não é hora disso, não é hora daquilo", até a poesia ela conseguia transformar num filme mudo a preto e branco.
Mas do lado da casa da avó, havia um terreno abandonado, onde todas as espécies de flores resolveram nascer, especialmente a Rainha Flor, mas isso já é outra história, e Ella passava a tarde toda a correr no meio de todas as margaridas, rosas, gerânios, orquídeas, e infinitas cores femininas, e masculinas, que tanto alegravam o seu correr...
Entretanto Ella desde pequena sempre alimentou o sonho de conhecer outros mundos, de correr em outros jardins e brincar no meio de flores que ela ainda não sabia o nome...
Naquela tarde o seu tio havia contado a história de uma menininha que ficou coberta de pólen e centenas de borboletas pousaram no seu corpo minusculo, com o bater de suas asas a levaram para longe dali, a intenção do seu tio era a assustar, pois ela sempre parecia que tinha ido para um rali no deserto quando voltava para casa, mas o tiro saiu pela culatra.
Ella pensou, e pensou, com a sua enorme sabedoria de seis anos, como faria para ter o corpo coberto de pólen, foi quando teve a ideia, em vez de correr pelo terreno florido, neste dia Ella rolou no meio das flores, esfregava as pétalas na sua pele, e sorria, um sorriso rasgado, um sorriso cheio de esperança, do seu plano dar certo.
Uma hora depois, tinha os joelhos ralados, os braços arranhados dos espinhos e galhos das flores, e o vestido amarelo castanho da terra, mas na face suja e encarnada, o sorriso triunfante de alguém que conseguiu o que queria.
Sentou-se no meio das flores amassadas e despetaladas, e esperou que as borboletas pousassem no seu corpo, uma ou outra de vez em quando apareciam, mas nada de centenas de asas a leva-la para longe, para outros mundos...
Ficou ali sentada horas, até a sua avó gritar a plenos pulmões pela milésima vez o seu nome, levantou-se sacudindo a saia do vestido, cruzou os braços em volta do corpo, e quando chegou perto do seu tio deu-lhe um chute na canela, ele virou-se para ela assustado, mas quando viu as lágrimas a rolar pela sua face de menininha grande, enterneceu-se e perguntou o que se passava.
Ella lhe contou o resultado do seu plano, e disse que jamais voltaria a acreditar na magia, o seu tio, que ficou completamente aborrecido da sua história mais ter encantado Ella do que assustado, olhou para aquela pequena com alma de gigante, e disse:
"Ella podes ir a qualquer lugar do mundo, basta fechar os olhos e voar..."
Durante muito tempo seguiu o conselho de seu tio, mas conforme foi crescendo, voar de olhos fechados foi ficando cada vez mais complicado, e o mundo que tinha vontade de conhecer mais distante...
Toda vez que via uma borboleta a voar, sorria em silêncio lembrando da pequena Ella sonhadora, a Ella que acreditava que centenas de borboletas a levariam a voar para um lugar mágico...
Então um dia Ella o conheceu, sentiu o amor a brotar da raiz de seu seu pé até os seus cabelos, o seu corpo transformou-se num caule, e o seu coração num botão de flor, a flor amor, e as borboletas enfim vieram, alojaram-se no seu estômago, e com o bater de suas asas, voaram com Ella para o mundo mágico do acreditar, o acreditar que quando abrimos a porta do nosso circo, não importa em que idade, a magia sempre acontece.