
No dia 25 de marco de 2001 ela partiu sem olhar para trás...
Ela sempre soube que não pertencia aquele lugar, e as pessoas faziam questão de confirmar a sua certeza todos os dias de sua vida.
Andava pelas ruas sentindo-se uma imigrante deslocada, a sua volta pessoas com semblantes diferentes, gostos diferentes, vida diferente, sonhos diferentes, tudo era igual e ela não encaixava-se naquela peça.
Durante anos ela imaginou aquela partida, imaginava-se dentro de um carro, um Ford Thunderbird, como o do filme "Thelma e Louise", ela pensava muito naquele filme, pois sempre admirou quem tem coragem de ir sem olhar para trás.
Oito anos depois, ela acorda e abre a janela de seu quarto, um quarto diferente, do outro lado do oceano, com pessoas e gostos diferentes, e até uma própria versão dela diferente.
E a mesma cena apareceu na sua cabeça, a cena final, o carro a voar nas montanhas...
Ela sempre quis voar, sonhava vezes sem contas que planava sem asas, mas no sonho tinha medo...
Agora na varanda, de braços abertos, como se fossem asas, e o vento a tocar a sua face de olhos fechados, ela só pensava no velho thunderbird, na sua cena final preferida, ela dentro do carro, com uma parte do seu mundo no banco de trás, e o seu outro eu no banco do lado, seguindo por uma estrada sem mapas, sem GPS, sem destino, seguindo para um mundo onde jamais seriam imigrantes, pois era um mundo construído por eles...
No filme Thelma e Louise transgrediram as leis, e não encontraram outra alternativa que voar com o Thunderbird pelas montanhas a baixo...
Eu própria estou a querer transgredir leis humanas e divinas, e até mesmo já posso considerar-me uma criminosa, já ultrapassei algumas linhas do bom senso, pergunto-me se teremos outra alternativa, se poderemos apenas seguir caminho no nosso Thunderbird, ou se teremos de voar pela ultima vez...
Quando ela vê um filme que não gosta do final, ela o reconstrui na sua cabeça, as vezes até acredita mesmo naquele final, e quando alguém diz que não foi assim, ela ri de si mesma, por ser tão aluada, se eu não gostar do meu final, será que o poderei reconstruir?
A única coisa que ela sabe neste momento, é a imagem que tem de si no carro, com a Cat Power a cantar Oasis no rádio, os seus cabelos a voar com o vento, o sorriso de canto de boca pintado na face, uma mão no volante e outra delicadamente preenchida.
Ela só quer ir sem olhar para trás.

1 comentário:
"Ela sempre quis voar, sonhava vezes sem contas que planava sem asas, mas no sonho tinha medo..."
Você me faz pensar, e adoro, adoro...
Muitas vezes temos medos...vários, principalmente o de sofrer. E por ter medo de sofrer não arriscamos, não experimentamos, não damos alguns passos.....e sofremos. Sofremos a dor de não ter tentado, de não saber como é, de não ter ido....o ser humano e suas complexidades.
abraços forte
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